domingo, 12 de junho de 2011

Ideologia e Solidariedade: Remédios da Alma.



Marcamos o nosso ponto às 10 horas da manhã na Cinelândia e com a chegada de todos os membros do grupo, partimos em retirada para inauguração do espaço Célula Urbana, em que ocorrerá o Curso de Formação de Agentes Comunitários de Comunicação na favela do Jacarezinho.

Percorrendo as ruelas e os becos da favela vem aquele sentimento oco de um vazio existencial no peito. Começo a me sentir culpada pelos meus sofrimentos e dores individuais. O remorso então, toma conta do meu âmago.

Como podemos ser omissos, conformistas e continuarmos na zona de conforto, desconhecendo os problemas de uma sociedade dessas, onde a violência, a miséria, o medo e a desesperança são imperiosos pela lacuna do Estado?



Na entrada da favela a primeira visão que tenho me aterroriza. São adultos, jovens, adolescentes e até crianças, agrupados feito zumbis na Cracolândia pelos trilhos da estação ferroviária. Esse é o remédio que encontram para amortecer suas dores.



Vou adiante, pelas vielas levada pelos sons das buzinas ensurdecedoras que me tortura os tímpanos num aviso alardeado de abre-alas e, me fazem entrar no balé com passos em zigue-zague para desviar das motocicletas.

Não há o fedor repugnante dos ratos, apesar de vários montinhos de lixo distribuídos numa organização surrealista, apenas o odor da Cannabis sativa queimada. Pelo visto a Comlurb não passa por lá.

As margens do caminho percorrido, têm-se o comércio... Os moradores daquela Índia Carioca apenas se assemelham aos Indús Asiáticos na miséria, pois seus semblantes são sofridos, seus olhos opacos e a desesperança são gritantes. Somente as crianças ainda trazem seus olhos brilhantes com sorrisos inocentes, mas que em pouco tempo pela consciência da opressão perderão sua luz. Deve ser por isso, que os humanistas em seus trabalhos sociais acreditam numa possibilidade de futuro para esses desvalidos.

Os idosos prenderam minha atenção, perambulando sem itinerário feito almas penadas, maltratados pela vida e abandonados sem qualquer perspectiva de descanso. As adolescentes apresentando seus ventres férteis na espera de completá-los, outras já traziam a barriga cheia com um status diferenciado naquela sociedade esquecida.

Muitos são magros, pálidos e evidenciam enfermidades sérias que me remetem à época dos meus estágios da faculdade de direito, em plantões pelos presídios atendendo presos tuberculosos e soropositivos.  

Os diversos sons musicais misturados pelas buzinas me fazem refletir as palavras do meu saudoso e admirado Avô – “Verás risadas nas favelas e choros nos castelos...”. Mas, como conseguem tamanha resiliência ?!?! Vivendo assim, marginalizados e entregues a própria sorte ?! Acho que essas falsas alegrias são defesas de sobrevivência.



Sinto meus companheiros, já com ares de cansaço e sem a empolgação da chegada. É como se o grupo tivesse levado uma duchada de água fria, sem despertá-los qualquer forma de salvação daqueles esquecidos. Ouço um comentário inusitado diante da minha descrença de mudar o mundo, “Na política e no amor, se há um espaço vazio, alguém vem e o ocupa”. Célebre máxima ! Não podemos esmorecer, enquanto houver desigualdade hedionda terá sempre trabalho a fazer.



Penso nas palavras do meu Pai – “O mundo é mau e não podemos compactuar com isso...”, apesar da minha ideologia esquerdista de não aceitar as esmolas dadas como forma de se isentar da responsabilidade social, ele tem razão em seus atos de solidariedade com as crianças de sua cidade na distribuição de alimentos e brinquedos às crianças. Está fazendo a sua parte, já que não tem mais o vigor de seu passado, integralmente dedicado a profissão.

Lembro-me da minha Mãe envolvida em seus trabalhos voluntários pelos hospitais, no Instituto Benjamin Constant lendo histórias para as crianças, atendendo os angustiados em seus desabafos. E, me orgulho dela.

Entristecida e deprimida sinto vergonha do meu sofrimento pessoal e agradeço a terapia vivida naquele domingo enriquecedor. Assim, sou grata ao acolhimento dos meus companheiros que me afagam a alma.

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