domingo, 28 de outubro de 2012

Carta Testamento - Guarani-Kaiowá



Carta da comunidade Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay-Iguatemi-MS para o Governo e Justiça do Brasil


Nós (50 homens, 50 mulheres e 70 crianças) comunidades Guarani-Kaiowá originárias de tekoha Pyelito kue/Mbrakay, viemos através desta carta apresentar a nossa situação histórica e decisão definitiva diante de da ordem de despacho expressado pela Justiça Federal de Naviraí-MS, conforme o processo nº 0000032-87.2012.4.03.6006, do dia 29 de setembro de 2012. Recebemos a informação de que nossa comunidade logo será atacada, violentada e expulsa da margem do rio pela própria Justiça Federal, de Naviraí-MS.

Assim, fica evidente para nós, que a própria ação da Justiça Federal gera e aumenta as violências contra as nossas vidas, ignorando os nossos direitos de sobreviver à margem do rio Hovy e próximo de nosso território tradicional Pyelito Kue/Mbarakay. Entendemos claramente que esta decisão da Justiça Federal de Navirai-MS é parte da ação de genocídio e extermínio histórico ao povo indígena, nativo e autóctone do Mato Grosso do Sul, isto é, a própria ação da Justiça Federal está violentando e exterminado e as nossas vidas. Queremos deixar evidente ao Governo e Justiça Federal que por fim, já perdemos a esperança de sobreviver dignamente e sem violência em nosso território antigo, não acreditamos mais na Justiça brasileira. A quem vamos denunciar as violências praticadas contra nossas vidas? Para qual Justiça do Brasil? Se a própria Justiça Federal está gerando e alimentando violências contra nós.  Nós já avaliamos a nossa situação atual e concluímos que vamos morrer todos mesmo em pouco tempo, não temos e nem teremos perspectiva de vida digna e justa tanto aqui na margem do rio quanto longe daqui. Estamos aqui acampados a 50 metros do rio Hovy onde já ocorreram quatro mortes, sendo duas por meio de suicídio e duas em decorrência de espancamento e tortura de pistoleiros das fazendas.

Moramos na margem do rio Hovy há mais de um ano e estamos sem nenhuma assistência, isolados, cercado de pistoleiros e resistimos até hoje. Comemos comida uma vez por dia. Passamos tudo isso para recuperar o nosso território antigo Pyleito Kue/Mbarakay. De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs, avós, bisavôs e bisavós, ali estão os cemitérios de todos nossos antepassados.

Cientes desse fato histórico, nós já vamos e queremos ser mortos e enterrados junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui.

Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação e extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para  jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais. Já aguardamos esta decisão da Justiça Federal. Decretem a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay e enterrem-nos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem mortos.

Sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo em ritmo acelerado. Sabemos que seremos expulsos daqui da margem do rio pela Justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos meramente em sermos mortos coletivamente aqui. Não temos outra opção esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai-MS.

Atenciosamente, Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay

Em 2004, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou decreto de homologação de 14 terras indígenas, numa área total de 2.337.883 hectares. No entanto, a fim de evitar conflitos com os posseiros que vivem nas Terras Indígenas, ainda foi assinado um convênio para que o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), ficasse com a responsabilidade de re-assentamento desses posseiros. Desta forma, caberia ao Incra o re-assentamento dos colonos em área demarcada no mesmo estado em que se localizam as terras indígenas homologadas.

O decreto beneficiava os povos indígenas Tikunas, Guaranis, Mura, Kulina, Tora, Aripuanã, Diahui, além de grupos isolados que vivem na região do Alto Tarauacá, no Acre. Assim, o Líder da Tribo Guarani-Kaiowá da área do Panambizinho, em Mato Grosso do Sul, esperava que fosse reduzido os suicídios entre os indígenas, como afirmou na época: "O número de suicídios de indígenas vai diminuir após a homologação das nossas terras".  


Ademais, a homologação pretendia beneficiar outras nove etnias em três estados com direito a suas terras, no total de 2.400 hectares. Sendo regulamentadas, as Terras do Lago Jauari, Nova Esperança do Rio Jandiatuba, Tora, Kumaru, Diahui, Paraná do Arauató, Rio Jumas, Lauro Sodré, Alto Tarauacá, Rio Urubu, Sepoti, Deni e Picati. Eis que, no Brasil há 102 milhões de hectares de terras indígenas, cuja ocupação dos colonos atinge o percentual de 10% dessas áreas.

Considerando a homologação, acrescentou Valdomiro Aquino, índio da tribo Guarani Kaiowá:  "Temos uma terra. Temos onde criar nossos filhos e netos. Não precisamos mais fugir"

Para o Presidente Lula era uma questão de justiça e o governo não estaria fazendo nenhum favor ao reconhecer essas áreas, conforme afirmou: "Nós não estamos fazendo nenhum favor quando reconhecemos uma terra indígena. Estamos fazendo apenas justiça para os que foram vítimas de injustiça durante tantos anos". Ressaltando ainda, que cabe a sociedade reivindicar e exigir do governo mais atuação: "Quem está no Palácio governando pode até achar que está tudo resolvido se não tiver reclamação"

Acontece que em 2009, o Ministro Gilmar Mendes na época como Presidente da Suprema Corte (STF), suspendeu liminarmente o aludido decreto presidencial que protegia os direitos dos Indígenas, em favor dos fazendeiros da região. Corroborando diretamente com os interesses dos invasores poderosos das fazendas Polegar, São Judas Tadeu, Porto Domingos e Potreiro-Corá., em prejuízo das minorias indígenas. O que nos leva a crer uma evidente parcialidade e descrença do Poder Judiciário, como um Poder paralelo apenas para atender os interesses da classe dominante.  

Considerando, a afronta sumária do STF quanto aos direitos dos verdadeiros donos das Terras, objeto dos conflitos, a situação encontra-se periclitante, com suicídios dos índios e ameaça de um genocídio iminente, dado a decisão em setembro do corrente ano pela Justiça Federal de Naviraí em Mato Grosso do Sul, em expulsar definitivamente a comunidade Guarani-Kaiowá de suas Terras. 

Não obstante, a injustiça proferida e as ameaças dos pistoleiros contratados pelos fazendeiros da região respaldados pelo "Poder Judiciário". A comunidade Guarani-Kaiomá totalmente desamparada lança mão de um recurso alheio à sua cultura, através da supra mencionada Carta Testamento em apelo por suas Terras, em que pleiteiam morrer por seu território sagrado. 


Fonte: CIMI - Conselho Indigenista Missionário

              www.rededemocratica.org 

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Carta de Repúdio à Proposta de Internação Compulsória de Adultos pela Prefeitura do Rio de Janeiro


Nós, entidades e movimentos sociais que integram a Frente Estadual de Drogas e Direitos Humanos do Rio de Janeiro (FEDDH), articulada com a Frente Nacional de Drogas e Direitos Humanos (FNDDH), viemos a público repudiar as últimas declarações do prefeito da cidade do Rio de Janeiro sobre a continuidade e expansão da política de internação compulsória, que agora, além das crianças e adolescentes em situação de rua, deverá incluir adultos.
Defendemos uma política inclusiva, humanizada, não discriminatória e que garanta o direito à saúde, à liberdade, à integridade e à dignidade das pessoas em situação de rua, em uso de drogas ou não, em oposição às medidas da atual administração municipal de defesa da ordem pública travestidas por um discurso de proteção ao direito à saúde e à vida dos usuários de drogas. Somos contrários às operações de recolhimento e à utilização abusiva e indiscriminada das internações compulsórias que, ademais de tratar essas pessoas de forma massificada e expô-las a toda forma de abuso, negligência, maus tratos e violência, consomem os recursos públicos que deveriam estar sendo utilizados para financiar os serviços abertos, inclusivos, de base comunitária, investir nos recursos humanos adequados para tanto e viabilizar a construção de projetos terapêuticos individualizados que promovam a autonomia, a cidadania e a inclusão social.
Alinhados aos princípios da Reforma Psiquiátrica brasileira, repudiamos as medidas baseadas na ampliação de leitos psiquiátricos em instituições asilares ou fechadas, estigmatização, privação de liberdade e institucionalização e exigimos o cumprimento do disposto no Artigo 4º da Lei 10.216/2001 que estabelece que “A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes”.
Atualmente, a cidade do Rio de Janeiro possui um CAPSad (Centros de Atenção Psicossocial para usuários de álcool e outras drogas) para cada um milhão e 200 mil habitantes. Para que se tenha uma ideia, no município de Recife essa proporção é de um CAPSad para cada 250 mil habitantes. Entendemos que o redirecionamento de recursos para o financiamento de internações compulsórias, além de atingir o direito dessas pessoas a receber atenção integral em serviços orientados à reinserção social, contraria as diretrizes preconizadas nas políticas nacionais de saúde mental, assistência social e combate à tortura e fere os compromissos assumidos pelo Brasil na prevenção, promoção e proteção da saúde mental e dos direitos humanos.
Como entidades e movimentos sociais com atuação nos campos da infância e adolescência, saúde, assistência social, cultura, educação, esporte, luta antimanicomial, movimento negro, população em situação de rua, egressos penais e nos conselhos profissionais e universidades, defendemos a necessária ampliação e fortalecimento da rede pública de políticas sociais, em conformidade com o aparato legal e institucional regulamentados pelos Conselhos Nacionais e Ministérios da Saúde, Desenvolvimento Social e Combate a Fome e demais instâncias existentes.
Exigimos:
  • A ampliação e o fortalecimento da rede de atenção psicossocial, com a abertura de mais CAPS, CAPSad, CAPSi, principalmente na modalidade III (24 horas) e outros serviços da rede que possam prover cuidados de urgência, emergência, atenção hospitalar, Residências Terapêuticas, Centros de Convivência e Unidades de Acolhimento Infanto-Juvenil e de Adultos;
  • O incremento das equipes da Estratégia de Saúde da Família e dos Consultórios na Rua, bem como dos NASF (Núcleo de Apoio à Saúde da Família), como estratégia prioritária no trabalho com os usuários de drogas, diretamente nos seus territórios;
  • A ampliação da rede de serviços da assistência social, em cumprimento à Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais instituída na Resolução 109 do CNAS, como, por exemplo, os CREAS (Centros de Referência Especializados da Assistência Social) e o CENTRO POP.
  • Garantia de financiamento de políticas públicas nas áreas de cultura, educação, esporte e lazer com a criação de projetos e programas que tratem a questão de forma transversal em parceria com escolas, universidades, Pontos de Cultura, Segundo Tempo, entre outros.
Da mesma forma, exigimos que, na atenção e no desenvolvimento de ações pelo poder público junto à população de rua identificada como usuária de crack e outras drogas, haja consonância com os princípios da atenção integral e da intersetorialidade das diferentes políticas (educação, trabalho, habitação, esporte e lazer, cultura, saúde, assistência social, dentre outras), garantindo o acesso da população aos diferentes direitos. As políticas públicas voltadas a esta parcela da população devem respeitar a dignidade e a garantia dos direitos humanos, não sendo pautadas na repressão e na segregação.
Existem alternativas concretas para o atendimento humanizado e pautado na garantia de direitos da população. A Frente Estadual Drogas e Direitos Humanos cobra das autoridades públicas a abertura de espaços de diálogo e interlocução com os diferentes atores sociais, procedimento apropriado no Estado Democrático de Direito.
Rio de Janeiro, 24 de outubro de 2012.

Frente Estadual Drogas e Direitos Humanos – Rio de Janeiro:

ABL
ABGLT
Coletivo de Mulheres Feministas
ABRASME
Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População de Rua e de catadores de material reciclável – CNDDH/RJ
CRESS/RJ-Conselho Regional de Serviço Social
CRP/RJ-Conselho Regional de Psicologia
Grupo Tortura Nunca Mais/RJ
Justiça Global
Movimento D’ELLAS
Movimento Nacional de População de Rua-MNPR
NEPS/Faculdade de Serviço Social/UERJ
Núcleo Estadual do Movimento da Luta Antimanicomial
Projeto Tranversões-ESS/UFRJ
Rede Rio Criança
Assinam também:
Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da ALERJ
Conselho Federal de Psicologia – CFP
Conselho Federal de Serviço Social – CFESS
KOINONIA
Maria Helena Zamora – Professora do Instituto de Psicologia da PUC/RJ
Fonte: www.rededemocratica.org

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Um julgamento essencialmente político...

Quando entrei para faculdade de direito era época da formação da atual Constituição Federal, aonde havia uma esperança contagiante de um Estado Democrático de Direito. Pois, desde que nasci nunca havia tido contato com a Democracia e trazia nos ombros o pesado legado de ser filha da ditadura. 

Por conseguinte, nunca tinha visto pelas imagens televisivas nenhum Presidente subir a rampa do Planalto, apenas ditadores e havia um vácuo desde João Goulart que foi Presidente do Brasil democraticamente eleito pela vontade do povo. Naquela época, mesmo o vice-presidente era eleito por votação, se não me engano. 

Tancredo Neves nunca foi Presidente, eis que o povo não teve a liberdade de escolha. Então, tanto pela nomeação quanto por sua morte não subiu a rampa do Planalto. Assumiu, José Sarney que também não foi Presidente, apenas colocado ali para atender aos interesses dos velhos ditadores. Haja vista, que presidiu o PDS partido da ditadura.

O primeiro Presidente que vi tomar posse "democraticamente" foi Fernando Collor que mal esquentou a cadeira do Planalto. Assumindo, outro vice, Itamar Franco, que não fora votado pelo povo, apenas indiretamente. E, aí por diante...

Voltando ao meu ingresso na faculdade, a Constituição Federal estava saindo do forno e foi matéria de muitas aulas e questionamentos a respeito. Seguindo a citação corriqueira "me apaixonei pelo direito penal, mas me casei com o civil".

Todavia, finalmente, estávamos diante de uma Lei Maior. E, fiquei admirada com a nossa norma jurídica que por mais que questionem a quantidade de recursos e a demora por conta do contraditório, nosso direito é na minha opinião um dos melhores do mundo. Tendo em vista, o Princípio da Ampla Defesa e do "in dubio pro reo", bem diferente do direito anglo-americano do norte que é sumário. Aqui não cabe o clichê leigo dos indícios e muito menos da lógica. Não, nosso direito é uma ciência jurídica e portanto, deve-se obedecer a norma cogente da matéria probatória, ou seja, das PROVAS !!! Há de ser respeitado a vontade do Legislador, sem provas não há crime.

Nunca ouviram dizer: "que as testemunhas são as prostitutas das provas" ?! Ao que parece nossos Ministros do Supremo Tribunal Federal, não. Pois, condenar sem provas é no mínimo aviltante. E, fere frontalmente nossa Carta Magna.

Ora ! Na ditadura não existia o Princípio do Contraditório. Todo cidadão brasileiro já era culpado. O ônus da prova era do Réu e não, do Autor. Assim, agiram os Ministros que condenaram sem provas os acusados da ação penal nº 470. Não irei me alongar, neste evidente e gritante erro processual, como na absurda decisão guerreada que comprova a INJUSTIÇA !!!

Eu poderia rasgar o meu diploma ou devolver me minha carteira à Ordem dos Advogados do Brasil. Mas, tenho que sobreviver do meu ofício e criar um filho. Então, não me calarei e bradarei aos quatro ventos que à mim, o STF não me convence com esse mesquinho relatório de que "há indícios" porque no âmbito penal não existe o Poder Discricionário do Juiz para condenar sem provas com base no "ao que tudo indica...".

Notadamente, o STF não exerce a função jurídica e sim, apenas e tão somente, a função política deixando cair por terra a nossa Lei Maior. Assim, fecho minha indignação aqui explicitada com a emocionante carta da Miruna Genuíno e discordando de Cazuza, MEUS HERÓIS NÃO MORRERAM DE OVERDOSE, MEUS HERÓIS MORRERAM NA TORTURA PELA DEMOCRACIA, e os que restaram vivos morrem agora em seus sonhos de LIBERDADE e JUSTIÇA.



“A coragem é o que dá sentido à liberdade”.


Com essa frase, meu pai, José Genoino Neto, cearense, brasileiro, casado, pai de três filhos, avô de dois netos, explicou-me como estava se sentindo em relação à condenação que hoje, dia 9 de outubro, foi confirmada. Uma frase saída do livro que está lendo atualmente e que me levou por um caminho enorme de recordações e de perguntas que realmente não têm resposta.

Lembro-me que quando comecei a ser consciente daquilo que meus pais tinham feito e especialmente sofrido, ao enfrentar a ditadura militar, vinha-me uma pergunta à minha mente: será que se eu vivesse algo assim teria essa mesma coragem de colocar a luta política acima do conforto e do bem estar individual? Teria coragem de enfrentar dor e injustiça em nome da democracia?
Eu não tenho essa resposta, mas relembrar essas perguntas me fez pensar em muitas outras que talvez, em meio a toda essa balbúrdia, merecem ser consideradas…

Você seria perseverante o suficiente para andar todos os dias 14 km pelo sertão do Ceará para poder frequentar uma escola? Teria a coragem suficiente de escrever aos seus pais uma carta de despedida e partir para a selva amazônica buscando construir uma forma de resistência a um regime militar? Conseguiria aguentar torturas frequentes e constantes, como pau de arara, queimaduras, choques e afogamentos sem perder a cabeça e partir para a delação? Encontraria forças para presenciar sua futura companheira de vida e de amor ser torturada na sua frente? E seria perseverante o suficiente ao esperar 5 anos dentro de uma prisão até que o regime político de seu país lhe desse a liberdade?

E sigo…

Você seria corajoso o suficiente para enfrentar eleições nacionais sem nenhuma condição financeira? E não se envergonharia de sacrificar as escassas economias familiares para poder adquirir um terno e assim ser possível exercer seu mandato de deputado federal? E teria coragem de ao longo de 20 anos na câmara dos deputados defender os homossexuais, o aborto e os menos favorecidos? E quando todos estivessem desejando estar ao seu lado, e sua posição fosse de destaque, teria a decência e a honra de nunca aceitar nada que não fosse o respeito e o diálogo aberto?

Meu pai teve coragem de fazer tudo isso e muito mais. São mais de 40 anos dedicados à luta política. Nunca, jamais para benefício pessoal. Hoje e sempre, empenhado em defender aquilo que acredita e que eu ouvi de sua boca pela primeira vez aos 8 anos de idade quando reclamava de sua ausência: a única coisa que quero, Mimi, é melhorar a vida das pessoas…

Este seu desejo, que tanto me fez e me faz sentir um enorme orgulho de ser filha de quem sou, não foi o suficiente para que meu pai pudesse ter sua trajetória defendida. Não foi o suficiente para que ganhasse o respeito dos meios de comunicação de nosso Brasil, meios esses que deveriam ser olhados através de outras tantas perguntas…

Você teria coragem de assumir como profissão a manipulação de informações e a especulação? Se sentiria feliz, praticamente em êxtase, em poder noticiar a tragédia de um político honrado? Acharia uma excelente ideia congregar 200 pessoas na porta de uma casa familiar em nome de causar um pânico na televisão? Teria coragem de mandar um fotógrafo às portas de um hospital no dia de um político realizar um procedimento cardíaco? Dedicaria suas energias a colocar-se em dia de eleição a falar, com a boca colada na orelha de uma pessoa, sobre o medo a uma prisão que essa mesma pessoa já vivenciou nos piores anos do Brasil?

Pois os meios de comunicação desse nosso país sim tiveram coragem de fazer isso tudo e muito mais.

Hoje, nesse dia tão triste, pode parecer que ganharam, que seus objetivos foram alcançados. Mas ao encontrar-me com meu pai e sua disposição para lutar e se defender, vejo que apenas deram forças para que esse genuíno homem possa continuar sua história de garra, HONESTIDADE e defesa daquilo que sempre acreditou.

Nossa família entra agora em um período de incertezas. Não sabemos o que virá e para que seja possível aguentar o que vem pela frente pedimos encarecidamente o seu apoio. Seja divulgando esse e/ou outros textos que existem em apoio ao meu pai, seja ajudando no cuidado a duas crianças de 4 e 5 anos que idolatram o avô e que talvez tenham que ficar sem sua presença, seja simplesmente mandando uma palavra de carinho. Nesse momento qualquer atitude, qualquer pequeno gesto nos ajuda, nos fortalece e nos alimenta para ajudar meu pai.

Ele lutará até o fim pela defesa de sua inocência. Não ficará de braços cruzados aceitando aquilo que a mídia e alguns setores da política brasileira querem que todos acreditem e, marca de sua trajetória, está muito bem e muito firme neste propósito, o de defesa de sua INOCÊNCIA e de sua HONESTIDADE. Vocês que aqui nos leem sabem de nossa vida, de nossos princípios e de nossos valores. E sabem que, agora, em um dos momentos mais difíceis de nossa vida, reconhecemos aqui humildemente a ajuda que precisamos de todos, para que possamos seguir em frente.
Com toda minha gratidão, amor e carinho,

Miruna Genoino – 09.10.2012

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Resposta de Zé Dirceu ao STF...


    Considerando a condenação midiática ao ex-Ministro José Dirceu, como se não bastasse o próprio STF ressuscita o modelo medieval da fogueira inquisitória. Manchando assim, nosso Estado Democrático de Direito em desrespeitar frontalmente a nossa maior previsão legal que trata-se do Princípio Basilar do "in dubio pro reo".


Como se bastasse, ainda, se omite quanto a verificação das provas, aliás provas estas que inexistem para condenação de José Dirceu na Ação Penal nº 470, mais vulgarmente conhecida pela denominação midiática do PIG, como "mensalão".

A seguir, com base no Princípio Constitucional do Contraditório, temos o Memorial da Defesa de José Dirceu - Ação Penal nº470.






EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 
  
JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA, por seu advogado, nos autos da ação penal nº 470, vem expor e requerer o que segue. 
 
1. Consignando o imenso respeito ao Exmo. Ministro Relator, é imprescindível fazer uma sucinta exposição de provas que infirmam a conclusão condenatória adotada no voto apresentado na sessão de 03/10/12, que abordou apenas a acusação de corrupção ativa, sem adentrar no crime de formação de quadrilha.  
 
2. Inicialmente, observa-se que o voto do Exmo. Relator atenuou a inegável intenção do ex-Deputado Roberto Jefferson em prejudicar José Dirceu, mediante a citação do depoimento de Luiz Roberto Albuquerque, que afirmou nunca ter testemunhado a relação de “amor e ódio” entre ambos, apenas na imprensa. 
 
Os autos provam que Jefferson somente criou suas denúncias contra Dirceu após ser flagrado em episódio de corrupção nos Correios. Ele próprio assumiu agir pautado por “instintos primitivos” e se dizia vítima de armação do então Ministro da Justiça, de um Procurador da República, uma Juíza Federal “esposa do Ministro Advogado Geral da União”, dizendo que todos se uniram “para atingir o PTB e encobrir o PT” (fl. 4219). Acusou veementemente não apenas Dirceu, mas também o corréu Gushiken, já absolvido por este Egrégio Plenário. 
 
3. E é justamente o suspeitíssimo depoimento de Jefferson que norteou o voto condenatório na conclusão pela existência de indícios contra José Dirceu no episódio da viagem a Portugal.  
 
Todas as testemunhas inquiridas sob juramento afastam qualquer possibilidade de envolvimento de José Dirceu (Miguel Horta e Costa, Antônio Mexia, Ricardo Espírito Santo). Se a viagem em si é capaz de suscitar dúvidas, a própria CPMI dos Correios concluiu, em seu relatório final, que a “Conexão Lisboa” envolvia outros interesses e personagens sem relação com o ex-Ministro da Casa Civil.  Inclusive, um integrante da CPMI questionou Jefferson sobre as possibilidades da viagem envolver apenas e tão somente interesses do PTB: 
 
“O SR.. DANIEL ALMEIDA (PCdoB – BA) (...) Os fatos mais recentes, que relacionam o Marcos Valério com a Portugal Telecom, colocam o tesoureiro do PTB, gente da sua estreita confiança, nesse processo. Relacionam o Marcos Valério e o tesoureiro do PTB com o IRB (Instituto de Resseguros do Brasil). V. Exa afirmou anteriormente que havia interesses de transações na Europa para recursos envolvendo o Instituto de Resseguros do Brasil. Esse instituto foi dirigido por gente indicada por V. Exa, e V. Exa informou, inclusive, que orientou os dirigentes que colocou lá para ajudarem na arrecadação de recursos para o PTB. As gravações que surgiram nos Correios também dão essa indicação. Dali começa um processo de apuração que poderia ir ao Instituto de Resseguros. Depois, outras denúncias surgiram. Isso não poderia nos levar a deduzir que oMarcos Valério e o Emerson Palmieri estariam operando não em nome do PT, mas em nome do próprio PTB, desses interesses, dos interesses do PTB, dos interesses, já que ele é multifacético?”(CPMI Compra de Votos, 04/08/05). 
 
Deve ser observado que a viagem se deu no ano de 2005, quandoPalmieri e Valério já se conheciam e muito bem, inclusive por conta de entrega e recebimento de valores na sede do PTB, consoante admitiu Emerson em juízo. Assim, viajaram lado a lado no avião, detalhe bem observado pelo Exmo. Ministro Presidente nos debates já desenvolvidos no julgamento desta ação. 
 
As contradições entre Palmieri e Jefferson são notáveis e atestam que ambos faltam com a verdade. Em seu interrogatório judicial, Palmieri afirmou que Valério, na própria viagem, lhe relatou a “questão da compra da Telemig pela Portugal Telecom, e a partir daí, então, a manutenção de cotas de publicidade” (grifamos). Mas, logo no calor dos fatos, no dia 04/08/05, Jefferson disse não saber nada sobre a relação entre estas duas empresas: 
 
“O SR. ARNALDO FARIA DE SÁ (PTB – SP) – Portugal Telecom e Telemig Celular tem alguma coisa? 
O SR. ROBERTO JEFFERSON (PTB – RJ) – Que eu saiba, não. Eu li isso no jornal, mas não foi conversado isso comigo.” (CPMI Compra de Votos, grifamos) 
 
É possível conceber que Palmieri tenha voltado de Lisboa ciente da relação entre Portugal Telecom e Telemig, mas não tenha contado este fato para Jefferson? E o que dizer da seguinte manifestação de Palmieri, dita em juízo, sobre a sua percepção acerca do objetivo da viagem: “Eu não sei se foi pra obter valores.”  
 
4. Claro, Palmieri não possui a mesma desenvoltura de Roberto Jefferson e tem visíveis dificuldades em corroborar suas mirabolantes mentiras, por mais que tente. Por exemplo, a absurda afirmação de Palmieri, lida no voto do Exmo. Relator, no sentido de que José Genoíno telefonava para Dirceu buscando autorização para fechar acordos, não foi pronunciada em seu depoimento policial e nem mesmo em seu interrogatório judicial. É um depoimento não confirmado tanto na fase policial como na judicial! 
 
Com a devida vênia, não assiste razão ao voto condenatório quando sustenta que Palmieri não possuía razão para inculpar José Dirceu, e que tal incriminação atrapalharia, inclusive, a tese de caixa dois eleitoral. Ora, é evidente que Palmieri se juntou a Jefferson no auge do escândalo político para apoiar a sua grande tese, que visava arrastar o Governo (Dirceu e Gushiken) para o meio da crise que fustigava o PTB. Sem o traquejo de seu chefe político, Emerson não foi adiante com parte de suas inverdades e caiu em contradições em outros diversos pontos. 
 
5. O voto do Exmo. Relator deu especial destaque ao fato de representantes de bancos e empresas terem afirmado que Marcos Valério fez o pedido de audiência com o ex-Ministro da Casa Civil.  
 
Todavia, não era o próprio Ministro da Casa Civil quem recebia as pessoas interessadas em solicitar o agendamento de audiências. A ex-funcionária Sandra Cabral testemunhou que “tinha um comitê de agenda que recebia esses pedidos de audiência” e que José Dirceu somente “era informado do nome da instituição que solicitava a audiência” (fl. 42.499), posto quenão lhe era repassada a identidade da pessoa que havia solicitado a reunião
 
Portanto, o fato de ter sido Marcos Valério ou qualquer outra pessoa o autor da solicitação de audiência, não permite a criação do argumento da existência de vínculo com o Ministro da Casa Civil, já que José Dirceu não tinha contato direto e nem mesmo era informado da identidade do portador do pedido da reunião
 
Receber representantes de empresas privadas e instituições financeiras era parte do exercício do cargo de Ministro da Casa Civil, existindo inclusive a denominada sala de investimentos, setor próprio para tal fim (Aldo Rebelo, fl. 29.490). Ex-funcionários da Casa Civil, as testemunhas Marcelo Sereno e Sandra Cabral, depondo sob compromisso de dizer a verdade, confirmaram que o ex-Ministro José Dirceu costumava regulamente se reunir com representantes de bancos e empresas (fls. 30.332 e  42.499). 
 
6. Ao contrário do que foi consignado no voto do Exmo. Relator, as reuniões não se revestem de caráter clandestino, ao revés, foram registradas na agenda oficial do ex-Ministro. Se os representantes dos bancos e empresas decidiram levar nas audiências Marcos Valério ou Delúbio Soares, seja como meros acompanhantes ou assessores, tal fato não é de responsabilidade de José Dirceu.  
 
Marcos Valério e Delúbio Soares, inclusive, atestam que os empréstimos e repasses jamais foram discutidos nestas reuniões. Neste sentido, são acompanhados por todos os demais participantes das reuniões, como Katia Rabelo e Ricardo Guimarães. 
 
Há uma testemunha presencial, Plauto Gouveia, que esteve presente na reunião mantida no Hotel Ouro Minas e provou que os empréstimos e repasses não foram discutidos. Com a máxima vênia, o voto do Exmo. Relator não deu o devido valor a este testemunho, que é prova cabal de que não havia nada de “clandestino” nos encontros oficiais e que neles não se tratavam dos empréstimos bancários. 
 
Igualmente não procede o argumento do Exmo. Relator no sentido de serinverossímil que o então Ministro da Casa Civil tenha se reunido com o Sr. Sabino Rabello para discutir questões relacionadas ao mineral nióbio, sob alegação de que este tema, supostamente, não seria afeto a Casa Civil. 
 
Ocorre que José Dirceu esclareceu tal assunto em seu notório depoimento prestado perante o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, com posterior juntada de documento comprobatório, atestando que, após a reunião com o Sr. Sabino Rabello, a Casa Civil elaborou a Nota Técnica nº 097/2003que segue anexa, intitulada “Exploração de Nióbio em jazida localizada em São Gabriel da Cachoeira – AM”. Referida nota técnica concluiu, que vários aspectos “desaconselham, no presente, a retomada do empreendimento”, frustrando o pleito do Sr. Sabino.  
 
Portanto, como regra nesta ação penal, provou-se mais uma vez que a reunião foi lícita, afeta a competência da Casa Civil e sem sombra de favorecimento indevido. 
 
7. Se a testemunha presencial Plauto Gouveia não foi muito considerada, o voto do Exmo. Relator deu imenso valor ao depoimento extrajudicial da Sra. Renilda, esposa do corréu Marcos Valério.  Depondo na CPMI, Renilda afirmou que, assustada com o eclodir dos fatos e preocupada com seu patrimônio, indagou ao seu esposo como os empréstimos seriam pagos. Valério, procurando tranquilizar sua mulher, disse que ouviu dizer que o então Ministro da Casa Civil sabia dos empréstimos.  
 
O publicitário esclareceu que nunca presenciou Dirceu discutindo empréstimos, mas que ouviu Delúbio Soares dizer que ele sabia, e que o Secretário de Finanças do PT comentou que tal discussão teria ocorrido no hotel Ouro Minas: 
 
“O SR. MARCOS VALÉRIO FERNANDES DE SOUZA - (...) Agora, se o senhor me perguntar, com toda a sinceridade: o aval do Sr. José Dirceu foi dado a você? Eu falo que não, mas foi confirmado por mim pelo Sr. Delúbio Soares” (grifamos). 
 
Ocorre que, como testemunhado por Plauto Gouveia, os empréstimos jamais foram discutidos no jantar ocorrido no hotel Ouro Minas. E, pior,Delúbio Soares negou veementemente ter repassado tal informação para Valério, sempre afirmando que Dirceu desconhecia os empréstimos.  
 
Fulminando completamente a credibilidade destes dois “testemunhos de ouvir dizer”, Valério, em juízo, passou a dizer que foi Silvio Pereira – e não mais Delúbio  – quem lhe passou a informação que o ex-Ministro sabia dos empréstimos: 
 
“questionado se sabia, especificamente, se José Dirceu tinha ciência desses empréstimos ao PT, diz que Silvio Pereira informou ao interrogando que José Dirceu sabia destes empréstimos, desde da origem dos mesmos; diz que não perguntou a Delúbio nem este lhe informou se José Dirceu sabia;” (grifamos) 
 
Portanto, restando devidamente comprovado que José Dirceu desconhecia os empréstimos, é inválida a criação de qualquer paralelo entre as datas das audiências oficiais e a concessão dos financiamentos bancários. 

8. Importantíssimo observar que, tanto a PGR como o voto do Exmo. Relator, não apontam um único ato concreto do ex-Ministro da Casa Civil no intuito de beneficiar os bancos Rural e BMG, ou ainda Portugal Telecom ou Grupo Espírito Santo. Foge a lógica que, se existisse de fato um relacionamento ilícito, os bancos não tivessem recebido de José Dirceu qualquer espécie de favorecimento em contrapartida nos mais de 2 (dois) anos em que chefiou a Casa Civil. 
 
O argumento de que o Banco Rural tinha interesse em uma possível interferência nos rumos da CPI do Banestado, além de inédito e inexistente na denúncia ou nos memoriais da PGR, não possui amparo fático algum. 
 
9. Também argumentou o Exmo. Relator que o vínculo entre Valério e José Dirceu pode ser demonstrado por meio do episódio envolvendo sua ex-esposa. Todavia, a testemunha Ivan Guimarães garantiu que a negociação do apartamento não guardou nenhuma relação com Dirceu, que sequer teve seu nome mencionado durante as tratativas (fl. 29.523). 
 
Maria Ângela Saragoça testemunhou em juízo sob o compromisso de dizer a verdade e não foi contraditada pelo MPF. Afirmou ser amiga de Sílvio Pereira e que foi exclusivamente através dele que obteve contato com Marcos Valério, sem qualquer atuação ou mesmo ciência do então Ministro da Casa Civil. Se Valério a ajudou com a intenção de se aproximar futuramente do ex-Ministro ou de agradar o dirigente petista Silvio Pereira, tal circunstância não repercute contra a inocência de José Dirceu. 
 
Respeitando o pensamento contrário do Exmo. Relator, entende-se que não é possível depreciar o testemunho de Ângela sob o argumento de que ela falou induzida.  
 
Esta testemunha respondeu diversas perguntas da Defesa, registradas em 4 (quatro) folhas deste processo (fls. 29.572/29.575), sem que houvesse qualquer objeção do MPF ou da Magistrada acerca de eventual indução. Em seguida, a testemunha respondeu a um número muito maior de perguntas do MPF, que ocuparam 9 (nove) folhas dos autos (fls. 29.576/29.584), sendo que uma pergunta ministerial foi indeferida pela Juíza. O testemunho, portanto, é juridicamente perfeito, integralmente válido e foi exaustivamente submetido ao crivo do contraditório
 
10. Valor excessivo foi dado pelo Exmo. Relator ao depoimento de José Borba, que justificou sua ida até uma agência bancária do Rural sob o argumento de que iria se reunir com Valério, alegando ser ele próximo ao Governo e capaz de influir em nomeações. Ocorre que Borba é voz isoladíssima nesse sentido, somente ele, e mais ninguém, sustenta coisa parecida. Ademais, este Egrégio Plenário entendeu que Borba estava no Rural para sacar dinheiro, não aceitando a versão de que ele ali se encontrava para debater nomeações com o publicitário mineiro. 
 
11. Igual exagero parece haver na valoração da tal “apresentação” de Marcos Valério a José Dirceu feita por Vírgilio Guimarães, que se limitou a afirmar que “uma vez, tinha um almoço lá nesse restaurante Francisco e estava cheio de Deputados lá. O Marcos Valério foi lá comigo e apresentei pra quem estava lá.” (fl. 20.095). 
 
12. Por fim, o voto do Exmo. Relator ressalta o fato de José Dirceu ter exercido a função de articulador político do Governo e, nesta função institucional, ter se reunido com parlamentares já condenados por corrupção passiva. 
 
Não há nada de anormal nestas reuniões e diversas testemunhas ouvidas nesta ação penal reforçam isso. Todos os corréus – menos Jefferson, pelos motivos já expostos – afirmam que estas audiências não envolviam o debate de questões financeiras. O ex-Ministro da Casa Civil esclareceu suas funções, ressaltando que sua interlocução política se dava “com os líderes dos partidos, com as bancadas, com os Prefeitos, com osGovernadores, com a sociedade” (grifamos). 
 
Logo, não era apenas com os Deputados denunciados que Dirceu se reunia, mas sim com diversos outros parlamentares e agentes políticos, não sendo plausível a criminalização de atos próprios ao exercício do cargo de Ministro da Casa Civil. 
 
Ainda constou menção, no voto do Exmo. Relator, que Dirceu tentou transferir para outros Ministros a responsabilidade pela interlocução com o Congresso em determinadas votações.  
 
No tocante a reforma previdenciária, ficou provado que o interlocutor do Governo na Câmara dos Deputados era o então Ministro da Previdência Ricardo Berzoini, sendo inexpressiva a atuação de José Dirceu (Maurício Rands, fl. 42.589, Carlos Abicalil, fl. 42.576, José Eduardo Cardoso, fl. 42.731, José Pimentel, fl. 42.777, Arlindo Chinaglia, fl. 42.908). 
 
Já na votação da reforma tributária, a prova dos autos novamente atesta que José Dirceu não era o interlocutor do Governo neste tema, pois “as negociações, elas foram conduzidas essencialmente pelo Ministério da Fazenda” (Bernard Appy, fl. 29.715). O então Ministro da Fazenda confirmou ter participado diretamente das negociações da reforma tributária, acrescentando que a “articulação dela envolveu diversas reuniões do presidente da República com governadores de estado e partidos políticos” (Antônio Palocci, fl. 42.795). 
 
13. Diante do exposto, ressalvando o respeito devido ao Exmo. Relator, resta claro que existem inúmeras provas nos autos que merecem ser consideradas e adequadamente valoradas, ensejando o decreto de absolvição de José Dirceu de Oliveira e Silva.  
 
Termos em que, requerendo a juntada da presente petição nos autos, com fundamento no princípio da ampla defesa, 
 
Pede deferimento. 
 
De São Paulo para Brasília, 
Em 4 de outubro de 2012. 
 
 
JOSÉ LUIS OLIVEIRA LIMA                     
OAB/SP 107.106  

Clique aqui e baixe o memorial em pdf.

Fonte do Memorial: http://www.zedirceu.com.br

terça-feira, 2 de outubro de 2012

CLEMENTE, o Comte sobrevivente da ALN "sem esqueletos no armário"...

Apesar das dores sofridas pela guerra, das privações referentes à liberdade juvenil, Clemente, admite seu compromisso humanista em lutar pela libertação do povo sob o domínio de um Estado repressor instituído por um golpe. Paga um preço alto até os dias atuais, como ele mesmo diz: "... eu não morri, mas eu morri, porque cada um dos meus companheiros que morreram eu morri um pouco junto"

A expressão utilizada por ele mesmo, "Eu não tenho esqueletos no armário...", comprova-se em seus dois livros publicados, "VIAGEM A LUTA ARMADA" e "NAS TRILHAS DA ALN", que o Guerrilheiro é compromissado com a verdade e, expõe, além de suas dores sofridas pela tortura de parentes e companheiros, pelas mortes sofridas e pelas mortes praticadas, todo seu legado de luta e abdicação à causa contra a Ditadura Civil e Militar no Brasil. 

Um dos seus ensinamentos contidos em sua obra literária, Viagem à Luta Armada, que nunca esquecerei e que carrego como dogma é a questão da VERDADE. Pois, "somos revolucionários, temos que assumir nossos atos, não se muda o mundo com mentiras"

Assim é, o Comandante Clemente, que na entrevista a seguir podemos saber um pouco mais da sua participação na história do nosso País.




"Nossa Organização chama-se Ação Libertadora Nacional como é que eu vou explicar para o meu povo que eu estou lutando para libertar o meu País me tornando responsável por trazer tropas de um exército estrangeiro para lutar dentro do meu País internacionalizando o conflito." 23'31’’

"Todo combatente tem marcas de guerra, mentira aquele que disser que não tem, não sofre, porque a guerra é o ato mais extremo. É o momento extremo da humanidade em que você tem dois lados se enfrentando com arma de fogo. Então, as marcas de combatente eu tenho e terei sempre e eu que tenho que aprender a conviver com isso." 34’53’’

"Arrependimento eu não tenho nenhum, porque a gente precisava ter na história do Brasil, isso muito claro, quando há tirania há resistência ... Agora, as marcas de guerra eu tenho, eu não morri, mas eu morri, porque cada um dos meus companheiros que morreram eu morri um pouco junto." 35’41’’

"A primeira companheira que eu tive na vida, Ana Maria Nacinovich foi fuzilada na Luta Armada, no bairro da Moca saindo de um restaurante, reconhecida pelo dono do restaurante." 36’30’’

"A minha mãe foi torturada, tive uma irmã torturada... Todas aquelas pessoas que iam morrendo eu ia morrendo junto também. E, tinha as mortes que eu cometi." 37’13’’

"Eu sou um humanista, eu entrei para Luta Armada por ser um humanista. Agora você veja que prejuízo que causou o Golpe de Estado, que fez com que brasileiros e brasileiras tivessem que participar de uma luta fratricida. Alguém acha que nós estamos ali porque gostávamos de ficar dando tiro os outros? Então nós temos essas dores." 37’57’’



Carlos Eugênio da Paz, Clemente.
Comandante da Ação Libertadora Nacional